Os impactos da covid-19 foram inúmeros, em vários setores da sociedade. E quando falamos deles, há uma parcela da população que foi ainda mais afetada: aqueles que vivem em maior situação de vulnerabilidade social, incluindo as crianças e adolescentes que integram essa triste realidade.
Mesmo que não sejam grupo de risco para a covid-19, as crianças e adolescentes necessitam ter seus direitos garantidos, para que possam se desenvolver de maneira plena e saudável.
Esses direitos são garantidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Vamos, ao longo desse artigo, abordar 7 direitos fundamentais para essa faixa etária e como eles podem ter sido afetados por conta da pandemia.
Para saber mais sobre o ECA, importante documento que completou 30 anos em 2020, clique aqui.
Dentre os principais direitos afetados, estão:
No Brasil, até 28 de setembro de 2020, foram 6.989 hospitalizações de crianças e adolescentes por impactos da covid-19. Dessas, 661 evoluíram a óbito, o que resulta em uma taxa de mortalidade hospitalar de 9,5%.
Desse total, divulgado em um estudo, a letalidade foi maior entre menores de 1 ano de idade (14,2%), crianças e adolescentes do sexo feminino (9,7%), indígenas (23,0%) e residentes em zonas rurais (18,1%), como também nas regiões Nordeste (15,4%) e Norte (9,7%) do país.
A maior preocupação acerca da covid-19 em crianças surge em situações onde há um colapso no sistema de saúde – como tem ocorrido em Manaus, com a falta de leitos e oxigênio desde que a nova variante do vírus se espalhou pela região. Nesse cenário, as maternidades e unidades pediátricas são afetadas, já que há uma demanda crescente de atendimento nos últimos dias diante de um cenário de descontrole da doença.
Outra situação que causou preocupação no final de 2020 foram os casos de uma síndrome rara entre crianças por conta da covid-19, intitulada Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SIM-P).
O público infantil, no geral, representa cerca de 2% dos diagnósticos. Mas, diante de um aumento geral de casos, observa-se também uma alta nas infecções de crianças, o que começa a repercutir nos atendimentos. Dessa forma, pode ocorrer um aumento de internações e até mesmo óbitos entre crianças e adolescentes.
Outros impactos da covid-19 são os efeitos indiretos ocasionados pela pandemia, como a queda nos índices de vacinação seguindo o Calendário Básico de Vacinação do Ministério de Saúde, que inclui vacinas do nascimento até à adolescência. Com a queda nos índices, há riscos da criança se infectar por doenças que poderiam ser evitadas. Outro risco é o retorno de doenças já erradicadas. Acesse o calendário completo de vacinação.
Além disso, a pandemia afetou o acesso de muitas crianças a programas de saúde e triagem (como por exemplo o teste do pezinho), podendo, como consequência, ocasionar outros problemas de saúde, conforme apontado em relatório da FIOCRUZ.
Sem aulas, muitas crianças também deixam de se alimentar por meio da merenda escolar. De acordo com o Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE), mais de 41 milhões de estudantes são beneficiados por ela.
Desse total, há uma parcela que depende dessa alimentação como principal refeição do dia. Não há dados precisos, mas há uma estimativa de aproximadamente 14 milhões de alunos, dentro dos critérios de pobreza como beneficiários do programa Bolsa Família, que podem depender dessa refeição.
A fome também aumenta com o desemprego e perdas nas receitas familiares. Se em 2018, cerca de 89 milhões de brasileiros viviam algum nível de insegurança alimentar, com a situação de pandemia a problemática deve se agravar.
Embora as aulas tenham voltado em algumas localidades, na maioria das escolas as aulas seguem sendo feitas de forma remota. Com o aumento dos casos de coronavírus ao redor do Brasil no final de 2020, o próximo ano letivo ainda é incerto.
Com o ensino transferido para o online, crianças em situação de vulnerabilidade social foram severamente afetadas, já que o acesso à internet não é algo presente em todos os lares brasileiros.
De acordo com a UNESCO, em 2020, cerca de 30% da população ainda não tem acesso à Internet no Brasil. Dos que tem acesso, 97% o fazem pelo celular – utilização restrita e que não oferece as mesmas possibilidades de ensino que um computador.
De acordo com a UNICEF, são mais de 4,8 milhões de crianças sem acesso à Internet. E a exclusão é ainda maior, de acordo com a pesquisa TIC Kids Online Brasil, nas áreas rurais (25% da faixa etária), nas regiões Norte e Nordeste (21%) e nos domicílios das classes D e E (20%).
Ficando em casa, as crianças deixaram de realizar práticas esportivas, frequentar atividades culturais e ter acesso ao lazer. Todas essas atividades são essenciais para o pleno desenvolvimento da faixa etária, mas diante do cenário precisaram ser realocadas para dentro de casa, cabendo aos pais auxiliaram com atividades divertidas dentro da nova realidade.
Mas, na falta desse cuidado dos pais em manter a criança se divertindo e se exercitando mesmo no ambiente interno, um dos efeitos indiretos, de acordo com a FIOCRUZ, é o aumento de problemas como sedentarismo e obesidade, bem como um distanciamento de atividades que promovem bem-estar físico e mental às crianças e adolescentes.
Além disso, para aqueles com acesso à Internet e celulares, houve um exagero no uso, o que pode acarretar efeitos negativos, como ansiedade, depressão e maior dificuldade para relacionamentos sociais, bem como problemas na visão pelo excesso de luz artificial. Para as crianças, o uso excessivo ainda compromete o pleno desenvolvimento das capacidades cognitivas, outro dos fortes impactos da covid-19.
Outras problemáticas muito sérias, como abuso sexual, cyberbullying, exploração sexual, exposição a conteúdos inapropriados, publicação de informações privadas, dentre outros, podem surgir com esse acesso ainda maior dos menores de idade à internet – especialmente por conta da presença constante de dispositivos móveis, que de acordo com a UNICEF, leva a um acesso online menos supervisionado e potencialmente mais perigoso.
A taxa de desemprego entre os jovens de 18 a 24 anos de idade ficou em 27,1% no primeiro trimestre de 2020, bem acima da média geral de 12,2% do país no período.
Considerando os adolescentes aprendizes (a partir de 16 anos, em um modelo de trabalho que visa a aprendizagem e formação técnico-profissional aliada à educação), a taxa pode ser ainda maior e chegar perto de 40%, de acordo com pesquisa da LCA Consultoria, baseada em dados do IBGE.
O estudo avalia que o desemprego vai crescer para todas as faixas etárias nos próximos meses, mas acaba por atingir mais duramente a parcela jovem dos trabalhadores. Por terem menos tempo de empresa e menores salários, oferecem menor custo de demissão. São também, na média, menos experientes
Com isso, muitos adolescentes em situação de vulnerabilidade podem acabar trabalhando de forma informal, sem seus direitos assegurados, para ajudar na manutenção da renda familiar.
A busca de direitos no que diz respeito a esses três pontos vai de encontro ao combate à violência contra crianças no Brasil e no mundo, que pode ter aumentado exponencialmente durante o período de isolamento social, fazendo parte dos terríveis impactos da covid-19 apesar da baixa de denúncias.
Segundo dados da UNICEF, os registros são subnotificados, já que as denúncias, em sua maioria, se originavam das escolas e hospitais. Dessa forma, com a situação de pandemia, os serviços de proteção perderam parte do controle sobre registros e ocorrências, o que torna a situação crítica e sem o devido acompanhamento das autoridades competentes.
O último relatório anual sobre violações de direitos humanos divulgado em maio pelo “Disque 100” apontou recebimento de 86.837 denúncias relacionadas a crianças e adolescentes no país em todo o ano de 2019, aumento de 14% em relação a 2018.
As principais violações foram negligência (62.019), violência psicológica (36.304), violência física (33374) e violência sexual (17.029). As denúncias podem conter mais de um tipo de violação.
Com o cenário de isolamento social, a convivência familiar se tornou mais forte para alguns, mas foi severamente restringida para outros – especialmente para as 30 mil crianças e adolescentes em casas de acolhimento e instituições públicas, segundo o Conselho Nacional de Justiça.
Destes, 5 mil estão disponíveis para adoção e 4,1 mil em processo de adoção. Com isso, foi necessário que o poder público lançasse uma recomendação com o intuito de reforçar as atividades de cada órgão competente, a fim de garantir a plena atuação do judiciário durante a pandemia, para que o ritmo dos processos de adoção não fossem atrasados.
Durante a pandemia, fomos atuantes na busca pela manutenção de direitos fundamentais de parcela da população vulnerável. Uma de nossas frentes foi a campanha “Nem vírus, Nem Fome: Compaixão”, onde beneficiamos mais de 30 mil famílias na linha da extrema pobreza com o “Kit Compaixão”, composto com alimentos básicos e itens de higiene.
Também promovemos atividades virtuais, fortalecemos nossas ações de proteção infantil e de Advocacy e seguimos com as ações de apadrinhamento, beneficiando crianças e projetos sociais ao redor do Brasil e contendo os impactos da covid-19.
Para saber sobre nossas ações e ajudar, acesse.
O ChildFund Brasil é uma organização de desenvolvimento social que por meio de uma sólida experiência na elaboração e no monitoramento de programas e projetos sociais mobiliza pessoas para a transformação de vidas. Crianças, adolescentes, jovens, famílias e comunidades em situação de risco social são apoiadas para que possam exercer com plenitude o direito à cidadania.